ELE imaginou todo um roteiro que lhe permitisse não cometer erros e assim, quem sabe, ser capaz de demonstrar que a merecia.
Esperou que ELA saísse do trabalho, no ponto de ônibus. Essa era a abertura do primeiro ato.
A cena seguinte seria falar sobre quaisquer assuntos até que chegasse o ônibus. Não se importou que durante a espera, duas viagens ocorreram. Não tinha pressa de chegar em casa. Não, aquele era o dia!
Tantas pessoas vindo e indo e ELE ali, sem desculpa para não embarcar.
ELA caminhou tranquilamente trazendo um livro. Primeiro empecilho no roteiro: ELE não poderia atrapalhar a leitura ou, pior, ELA não queria falar com ninguém nesse trajeto.
Primeiro ponto positivo: o ônibus não demorou. ELA subiu e sentou-se muito à frente. Segundo empecilho: não havia nenhum lugar vazio próximo para ELE.
O Diretor enlouquecia. Nada saia como estava no roteiro.
ELE fechou o pequeno caderno que levava e decidiu interromper a cena.
Segundo ponto positivo: um lugar na fileira de cadeiras ao lado vagou. Não havia tempo a perder. Seriam menos de dez minutos para o ponto final. o pano cairia. Ao público só restaria vaiar, aos críticos, condenar atores, diretor e até ao coitado do motorista que tinha horário a cumprir.
Retomou o roteiro e disse a "enorme" frase de abertura do segundo ato: "Oi!"
A resposta não foi a planejada e, portanto, como seguir adiante.
Não temeu. Emendou uma coisa sem sentido em outra e chegaram juntos ao final da viagem.
A cena prosseguiu. Caminharam até a casa d'ELA e o Iluminador caprichara num sol de quarenta graus à sombra.
- Um pouco de água?
- Pode ser.
Espera, silêncio, dúvida, angústia...
- Tem suco de abacaxi.
- Meu preferido.
- Meu também. Vou buscar. Melhor, almoça comigo?
ELA devorou com rapidez leopardina.
- A primeira vez é pra aplacar a fome; agora, pra sentir o sabor.
ELA, linda: cabelos lisos e negros, sombrancelhas fartas bem desenhadas; um sutil batom há pouco habitara aquela boca.
- Preciso ir. Obrigado!
- De nada. Aparece.
Temeu. Desapareceu.
Agora a viu novamente. Como Dorian Gray parece que o tempo não lhe afeta. Alçou voos tão altos que a miopia intelectual, financeira e moral d'ELE não lhe permitem enxergá-la. Brilha com um quase sorriso e aquele sutil batom está lá. Cabelo mais curto a torturar com a nuca à mostra.
O roteiro fracassou. ELE ficou lá, no ponto de ônibus. Quem sabe ELA venha de livro na mão.
Se você a encontrar por aí, não dê uma segunda olhadela. Ciúmes? Não!
ELA encanta ao primeiro olhar, inflama ao segundo e, ao terceiro, é amada eternamente. Sim, ELE a ama em silêncio há 22 anos!
A essa altura você merece saber quem são ELES. O nome d'ELE você verá algumas linhas abaixo. O d'ELA...
"Só a alguns é que tal graça se consente".
quinta-feira, abril 30, 2009
quarta-feira, abril 29, 2009
Por quê?
Quando penso que já aprendi o suficiente...
Imaginei que tinha - depois de tanta gente falar a mesma coisa, adoecido pra enxergar o mundo de outra maneira.
Não sei ao certo como é agora, mas dizem que, nos "tempos do meu pai", nascido quase no século retrasado, na escola tinha uma história de apanhar quando não se fazia a lição corretamente.
Tô fora! Quando não sei de uma tarefa tento aprender. Nunca pude concordar com a idéia de que só o sofrimento traz sabedoria. Quero aprender com alegria! Deve ser por isso que só se vai à escola obrigatoriamente; ninguém tem prazer dentro desses espaços cada vez mais bonitos arquitetonicamente, e mais grotescos em relacionamento humano.
Daí, ficar procurando explicações porque aluno entra armado na escola é discussão sobre o sexo dos anjos - que aliás, não se sabe qual é, mas deve ser masculino. Calma, mulheres de plantão! Eu explico. No Gênesis, aquele livro que é o primeiro da Bíblia, se você não está familiarizado, diz que os anjos olharam do céu e viram a beleza das filhas dos homens e, descendo à Terra, com elas "deitaram" e tiveram filhos. Não diz que veio nenhuma "anja".
Me perguntei qual a razão de não poder fazer mais certas coisas que gostava: tomar cerveja, comer uma carne mais gordurosa, passar a noite toda pelos bares e outras coisas relacionadas,. Parar de fazer tudo isso ia me ensinar. O quê!? A ler, escrever, conversar, observar, amar?
Passei os últimos 40 anos da minha vida amando. Tudo bem que não era lá esse amor romântico que algumas pessoas acreditam, mas era o meu jeito de amar. Continuo amando: da primeira à mais recente pessoa que conheco.
Quer saber? Pra eu aprender alguma coisa, leio, vejo o rio, observo as pessoas passando, como, bebo, descubro que o incêndio ajuda a renovar a floresta de eucalipto, que somos 25 milhões de habitantes na Amazônia, que tem gente estúpida e gente hipócrita - como diz Gilberto Gil.
Precisa de doença pra aprender? Qual é?
Mas, já que é assim... Vou ali fazer um teste no hospital e já volto.