terça-feira, dezembro 08, 2009

Só porque nada dissemos ontem. Nem eu nem vocês. E a chuva prolongou-se por toda a madrugada.

Nos dias chuvosos, tinha por hábito caminhar sem guarda-chuva, capas, botas, sem algo que o protegesse. Sempre gostara de ser incomum, ainda que se achasse médio. Precisava do frio que agora sentia para tornar-se aquecido quando chegasse ao local de destino. Tinha consciência de que não haveria nenhuma pessoa lhe aguardando, mas caminhava firmemente na direção definida. Supunha que a simples(?) lembrança dos que ali moravam seria suficiente para acalmar a ansiedade que carregava como um fardo às costas. Não costumava lamentar que os carros lhe sujassem com a lama misturada às poças de água que se acumulavam no trajeto. Seguia, era suficiente saber que havia um "onde chegar".


Nos dias chuvosos, tinha por hábito lembrar velhas canções calmas: como um bálsamo que se passa em feridas . Não tinha expectativas de cicatrização. Certas dores são melhores quando permanentes, tornando-o elegantemente viril. Tinha sonhos não realizados, poemas interminados, músicas não concluídas, temas desconexos, frases desconexas, vida desconexa.


Nos dias chuvosos, não lamentava. Sempre é possível ir àquele encontro, ainda que o cabelo se desfaça, que a roupa pareça mais velha, que as gotas de chuva sejam tomadas como lágrimas - ou as seriam realmente? É sempre possível que alguém apressadamente encontre um tempo para dizer "que chuva!", e continuar correndo em busca da proteção de casa.


Nos dias chuvosos, não temia. Aguçava o olfato com o cheiro da terra molhada, deliciava-se com a visão dos pássaros protegendo-se e aguardava, com dissimulada insatisfação, o momento em que todos voltariam a cantar alegremente. Então, nesse momento, tomado de uma tristeza vinda depois dos temporais, acordava para o fato de que a vida supõe movimentos terrestres e a chuva mudara de continente deixando-o assim, entre saudoso e irritado à espera que a previsão do tempo esteja correta e tudo volte a acontecer amanhã.

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